terça-feira, 31 de março de 2015

Manifesto contra a redução da maioridade penal


MANIFESTO CONTRA A REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL E PELO CUMPRIMENTO EFETIVO DA LEI FEDERAL: Nº 8069/90. (1)

A ACONTEMG constituída em prol da defesa dos direitos de crianças e adolescentes no Brasil, em consonância aos princípios acordados na Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança e aos direitos fundamentais previstos na Constituição da República,  lança esse manifesto contra redução da maioridade penal no Brasil e a favor do cumprimento do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Atentos às tentativas históricas de reduzir a idade penal no Brasil, a ACONTEMG vem publicamente reiterar seu posicionamento em defesa da manutenção da inimputabilidade penal aos menores de 18 anos, fundamentando-se em práticas e dados que apontam para a necessidade de termos políticas públicas que indiquem avanços e se proponham a atuar nas causas reais e não somente nas consequências, de um país que vivencia um processo cíclico e crescente de violência.

Em concordância com o artigo de Elaine Brum, publicado na revista Carta Capital em Abril de 2013, intitulado “Pela ampliação da maioridade moral” pontuamos que a mídia e os setores conservadores  tem se utilizado de afetividade individual para dar legitimidade a práticas Estatais. Com isso, a ACONTEMG, não nega seu sentimento e compreensão aos familiares das inúmeras vítimas de violência (das mais diversas), pois considera legítimo e de caráter individual. No entanto, do Estado esperamos ações que levem adiante o processo civilizatório, as conquistas de direitos humanos, a justiça, e o cumprimento efetivo do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Partindo desse pressuposto torna-se também legítimo enfatizar e denunciar os crimes contra as nossas crianças e adolescentes sendo poucos muito poucos registrados e geradores de inquéritos e responsabilização. Nós, Conselheiras e Conselheiros Tutelares de todo o Brasil, assistimos diariamente a prática de uma política de Estado ainda precária e violenta contra nossas crianças e adolescentes, principalmente, quando se trata dos que mais necessitam de sua proteção. Pois, nos deparamos com um Estatuto, uma lei, que muito se limita a teoria ou a práticas desqualificadas, pouco avaliadas e sem interesse político para sua efetivação. Haja vista, a precariedade de nossos Conselhos Tutelares que sequer conseguem se movimentar e participar das lutas necessárias a sua representação.

Isso também é crime e merece muito de nossa atenção. Mas se ainda não é o suficiente, utilizamos um documento da Fundação Abrinq bastante completo, que reúne os estudos mais recentes sobre o tema.  Segundo este documento, mais de 8.600 crianças e adolescentes foram assassinados no Brasil em 2010, segundo o Mapa da Violência. Esse número coloca o Brasil na quarta posição entre os 99 países com as maiores taxas de homicídio de crianças e adolescentes de 0 a 19 anos. Em 2012, mais de 120 mil crianças e adolescentes (dados de um único serviço de Disque Denúncia Federal, entre os mais de 27 serviços Estaduais desta natureza, e sem contar as milhares de denúncias diretas nos Conselhos Tutelares) foram vítimas de maus tratos e agressões segundo o relatório dos atendimentos no Disque 100. 

Deste total de casos, 68% sofreram negligência, 49,20% violência psicológica, 46,70% violência física, 29,20% violência sexual e 8,60% exploração do trabalho infantil. Menos de 3% dos suspeitos de terem cometido violência contra crianças e adolescentes tinham entre 12 e 18 anos incompletos, conforme levantamento feito entre janeiro e agosto de 2011”. Esses dados confirmam que quem comete violência contra crianças e adolescentes em sua maioria, são os adultos.

Do total de adolescentes em conflito com a lei em 2011 no Brasil, 8,4% cometeram homicídios. A maioria dos delitos é roubo, seguido por tráfico. Quase metade do total dos adolescentes em conflito com a lei esteve nesta situação entre os 15 e os 17 anos, conforme uma pesquisa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). E a maioria abandonou a escola (ou foi abandonado por ela) aos 14 anos, entre a quinta e a sexta séries. E quase 90% não completaram o ensino fundamental.

Ainda segundo Elaine Brum, é uma mentira dizer que os adolescentes não são responsabilizados pelos atos que cometem. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) prevê a responsabilização, sim. Inclusive com privação de liberdade, algo difícil e penoso para essa faixa etária. Mas, de novo, o Estado não cumpre a lei. Na prática numa parcela significativa das instituições que deveriam dar exemplo de cumprimento da lei e oferecer as condições para que esses adolescentes mudassem o curso da sua história, são oferecidos aos adolescentes o encarceramento, a tortura, maus tratos e violência sexual como cumprimento de pena.

Segundo a pesquisa do CNJ, em 34 instituições brasileiras, pelo menos um adolescente foi abusado sexualmente nos últimos 12 meses, em 19 há registros de mortes de jovens sob a tutela do Estado, e 28% dos entrevistados disseram ter sofrido agressões físicas dos funcionários. Sem contar que, em 11 estados, as instituições operam acima da sua capacidade. Será que a rotatividade da violência ocorre realmente por falta de lei? Será que essas instituições cumprem seu papel ao dispensarem precariamente tal serviço à sociedade? É certo que não.

Ao contrário do que a mídia hoje sugere o número de crimes contra a pessoa cometidos por adolescentes diminuiu – e não aumentou! Segundo dados da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, entre 2002 e 2011 os casos de homicídio apresentaram uma redução de 14,9% para 8,4%; os de latrocínio (roubo seguido de morte), de 5,5% para 1,9%; e os de estupro, de 3,3% para 1%.

Portanto, a ACONTEMG considera que os crimes cometidos pelos adolescentes têm relação com as condições concretas (de saúde, educação, lazer, esportes e cidadania) em que vivem nossas crianças e adolescentes, assim como as condições concretas em que os adolescentes cumprem as medidas socioeducativas. Por isso, reivindica ao Estado políticas públicas efetivas e dignas para garantir a cidadania de nossas crianças e adolescentes conforme preconiza o “tão difamado” Estatuto da Criança e do Adolescente, hoje ainda ignorado pela sociedade para fins de efetivação.

Davidson Luiz do Nascimento 
Presidente da Acontemg 


(*) Davidson Luiz do Nascimento. Pedagogo. Gestor III da Prefeitura Municipal de Contagem. Graduando em Ciências do Estado (UFMG). Pós-graduando em Gestão Pública (UFV). Presidente Associação dos Conselheiros e ex- Conselheiros Tutelares de Minas Gerais da (Acontemg). Educador Social da Escola da Cidadania da Fundação de Ensino de Contagem (FUNEC), Presidente da UMES-BH- Gestão 1998-1999. Email: nascimento.davidson@gmail.com



                 www.acontemg.blogspot.com 


(1) Texto: Organizado e idealizado pela ex-Diretora da ACONTEMG: Davidson Luiz do Nascimento e Keila Bastos. 

Agende a Capacitação dos Conselheiros Tutelares de sua cidade.

 

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